Prolactina e dopamina
A prolactina é um hormônio produzido na hipófise e responsável pela estimulação da mama para produção de leite na gravidez. Após o parto, os níveis de prolactina diminuem a menos que a mãe amamente. A prolactina é inibida pela dopamina secretada por neurônios do hipotálamo.

Além do controle da prolactina, a dopamina é um neurotransmissor importante para função motora, motivação e aprendizagem de reforço, agindo por diferentes vias neuronais.
O aumento patológico da prolactina leva à deficiência dos hormônios sexuais (hipogonadismo) no homem e na mulher.
A prolactina pode estar anormalmente alta devido à produção tumoral das células que a produzem da hipófise (prolactinoma), uso de medicações, hipotireoidismo, outros tumores da hipófise, lesões ou estimulação dos mamilos ou ainda lesão em tórax (como herpes zoster) ou pequenos traumas nessa região.
Nesse post, será abordada principalmente a influência dos medicamentos sobre a prolactina e os potenciais efeitos adversos dos agonistas dopaminérgicos, classe de medicações utilizadas para tratamento do prolactinoma, entre outras doenças.
Hiperprolactinemia induzida por medicamentos
Primeiramente, acerca do efeito das medicações sobre a prolactina, temos uma lista relativamente grande.
As medicações que bloqueiam os efeitos da dopamina na hipófise ou esgotam os estoques de dopamina cerebrais podem inibir essa supressão da dopamina sobre a prolactina. Essas medicações incluem os antipsicóticos, que são medicamentos usados para esquizofrenia e alguns tipos de depressão.
Como resultado final, os antagonistas da dopamina podem causar o aumento da secreção de prolactina pela hipófise. Essas medicações incluem os antipsicóticos, que são medicamentos usados para esquizofrenia, alguns tipos de depressão e utilizadas ainda no transtorno do controle dos impulsos.
Prolactina e antipsicóticos
Os antipsicóticos de primeira geração, mais antigos, tais como o haloperidol, trifluoperazina têm o risco consideravelmente maior de aumentar a prolactina, enquanto os antipsicóticos mais modernos como a clozapina, olanzapina, aripiprazol, ziprasidona e zotepina não aumentam ou aumentam em menor grau esse hormônio. Essa diferença deve-se a maior ou menor estimulação do receptor D2 presente nas células que produzem a prolactina na hipófise, os lactotrofos.
A risperidona, embora seja um antipsicótico de segunda geração, aumenta consideravelmente a prolactina.
Essa diferença entre os antipsicóticos no aumento da prolactina se deve a maior ou menor estimulação do receptor D2 presente nas células que produzem a prolactina na hipófise, chamadas de lactotrofos.
Prolactina e antidepressivos
Ao contrário da dopamina, a serotonina pode estimular a produção de prolactina. Os antidepressivos que inibem a recaptura da serotonina (SSRI), principalmente os mais antigos, podem também aumentar a prolactina.
A lista de medicamentos que aumentam a prolactina não se limita às medicações usadas na psiquiatria.
Os opioides e derivados são principalmente usados para dor e podem também aumentar a prolactina.
Tabela 1. Medicamentos que causam aumento persistente da prolactina

Sobre o aumento da prolactina secundário ao uso de medicações, de acordo com as Diretrizes da Endocrine Society, a suspensão ou troca da medicação por outra que não aumente ou aumente menos a prolactina é recomendada nesses casos.
Na impossibilidade de suspender ou trocar a medicação que aumenta a prolactina, deve ser feita a reposição de hormônio sexual nos casos de hipogonadismo de longa data.
Como o uso de agonistas dopaminérgicos pode piorar o quadro psiquiátrico, deve se ter muita cautela em se prescrever essa medicação em pacientes que estejam em tratamento com antidepressivos e/ou antipsicóticos. O alinhamento com o psiquiatra sobre qualquer a prescrição de qualquer medicação que possa afetar o quadro psiquiátrico é fundamental.
Aumento de prolactina e hipotireoidismo
O hipotireoidismo primário pode aumentar a prolactina via aumento do hormônio TRH (hormônio liberador da tireotrofina). O TRH por sua vez estimula primariamente as células que produzem o hormônio o TSH (tireotrofos), mas também a prolactina.
Diante de um aumento da prolactina é mandatório excluir o hipotireoidismo.
Agonistas dopaminérgicos : no caminho inverso
Os agonistas são medicações que estimulam determinado receptor, em contraste com os antagonistas.
Uso terapêutico dos agonistas dopaminérgicos
Os agonistas dopaminérgicos estimulam o receptor da dopamina e com isso diminuem a secreção da prolactina. São utilizados não só na endocrinologia para o tratamento de prolactinomas (o tipo mais comum de tumor hipofisário), para supressão da lactação na obstetrícia, mas também é uma das medicações possíveis para no tratamento de Doença de Parkinson e síndrome das pernas inquietas. Relembrando que não são utilizados no tratamento da hiperprolactinemia farmacológica causada pelos antipsicóticos.
Agonistas dopaminérgicos e prolactinomas
Para o tratamento dos prolactinomas, são utilizadas medicações derivadas do ergot (ergolínicos): a carbergolina e bromocriptina. Essas medicações apresentam semelhanças com neurotransmissores como a serotonina, dopamina e adrenalina.
A ação estimulatória da cabergolina e da bromocriptina sobre os receptores da dopamina é o efeito desejado para suprimir a secreção tumoral da prolactina.Pela ação nos receptores de serotonina, as duas medicações produzem efeitos colaterais como mais comuns, como náuseas e vômitos.
Pelo potencial efeito serotoninérgico nas válvulas cardíacas, altas doses dos agonistas dopaminérgicos podem levar a valvulopatias. Esse efeito colateral é raramente observado e não é recomendado o exame de ecocardiograma de rotina.
Agonistas dopaminérgicos e Doença de Parkinson
Atualmente, no tratamento da Doença de Parkinson, os agonistas dopaminérgicos utilizados são os não-ergolínicos: pramipexol e ropinirol e piribedil.
A bromocriptina e a cabergolina já foram utilizadas para Doença de Parkinson, mas as doses chegam até 10 vezes maiores que as utilizadas para o tratamento dos prolactinomas.
Agonistas dopaminérgicos e Transtorno de Controle dos Impulsos
Alguns efeitos colaterais desses agonistas dopaminérgicos incluem alucinações, insônia, comportamentos impulsivos, tais como hipersexualidade, jogo patológico, comer compulsivo, cleptomania, compulsão por compras, comportamento agressivo, variações do transtornos de controle dos impulsos.
O transtorno do controle dos impulsos já foi relatado em estudos de caso-controle em pacientes usando doses altas de agonistas dopaminérgicos para o tratamento de tumores hipofisários (1).
Há de se levar em consideração que o tratamento da hiperprolactinemia reverte o hipogonadismo (baixos níveis de hormônios sexuais). Se após o tratamento for observado o desenvolvimento da hipersexualidade, pode ser que o(a) paciente volte ao seu padrão “normal” e não que esteja desenvolvendo um transtorno de controle de impulso.
Recentemente, uma artigo de revisão francês avaliou a relação entre os agonistas dopaminérgicos utilizados para o tratamento da Doença de Parkinson, síndrome das pernas inquietas e prolactinomas com o transtorno de controle dos impulsos e encontrou uma associação complexa (2). Os principais achados que conferiram risco para o dese nvolvimento desse transtorno com o uso dessas medicações está relacionado ao tipo de agonista (principalmente utilizados na Doença de Parkinson), doses altas, sexo masculino (principalmente para hipersexualidade e jogo patológico), pacientes jovens (abaixo de 65 anos), estado civil (não casados) e história preexistente de sintomas ou transtornos psiquiátricos.
Considerações finais
O tratamento da hiperprolactinemia causada pelos medicamentos, principalmente os antipsicóticos, é uma situação muito complexa para o endocrinologista. O alinhamento da terapia com o psiquiatra ou médico que prescritor da medicação causadora do aumento da prolactina é fundamental. Por outro lado, o endocrinologista e outros profissionais que prescrevam agonistas dopaminérgicos, devem estar atentos ao aumento da impulsividade nos seus pacientes. A mensagem que fica para as pessoas que vão iniciar ou estão em tratamento para prolactinoma é que não há motivo para alarme pois esses efeitos colaterais são raros e mais estudos ainda são necessários. Na dúvida, converse com o seu médico.
Referências
1 BANCOS, I. et al. Impulse control disorders in patients with dopamine agonist-treated prolactinomas and nonfunctioning pituitary adenomas: a case-control study. Clin Endocrinol (Oxf), v. 80, n. 6, p. 863-8, Jun 2014. ISSN 1365-2265.
2 GRALL-BRONNEC, M. et al. Dopamine Agonists and Impulse Control Disorders: A Complex Association. Drug Saf, v. 41, n. 1, p. 19-75, Jan 2018. ISSN 1179-1942.
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