As glândulas endócrinas e os hormônios
A Endocrinologia é a especialidade que estuda as ações dos hormônios no organismo. Os hormônios são substâncias liberadas pelas glândulas endócrinas, que podem agir em células próximas ou distantes. Os hormônios cirulam ligados (fração ligada) a diversos tipos de proteínas e também na forma não-ligada (fração livre).

As glândulas endócrinas não tem ductos (canais) na sua estrutura e liberam os hormônios diretamente na corrente sanguínea. Diferente dessas são as glândulas exócrinas, já que liberam as seus produtos para o exterior do corpo ou para dentro de outro órgão através de ductos.
Como exemplos de glândulas endócrinas, temos a hipófise, a tiroide, as paratireoides, as adrenais; como exemplos de glândulas exócrinas, temos as glândulas sudoríparas (produzem o suor), as glândulas mamárias, as glândulas lacrimais e as salivares. O pâncreas é um exemplo de glândula mista, produz o hormônio insulina que é liberada na corrente sanguínea e o suco pancreático, liberado pelo ducto pancreático para dentro do intestino.
Como os hormônios são transportados no sangue?
Quando caem na circulação sanguínea, os hormônios são transportados por proteínas chamadas “carreadoras”. A fração livre do hormônio liga-se a seu receptor na célula alvo para produzir seus efeitos ou serem destruídos. A fração ligada não tem efeito biológico, ou seja, não produz nenhum efeito no organismo.
Há proteínas que transportam preferencialmente um tipo de hormônio, como os tiroidianos, sexuais e corticosteroide. São exemplos dessas proteínas mais específicas, a SHBG, que carreia os hormônios sexuais; a CBG, que carreia os hormônios produzidos pelas adrenai; a TBG, que carreia os hormônios tireoidianos.
Outras proteínas carreadoras, como a albumina e a transferrina, podem carrear hormônios de forma não preferencial.
As principais proteínas carreadoras estão exemplificadas na tabela abaixo.
Hormônios tireoidianos ligados e livres
Para os endocrinologistas, a fração livre dos hormônios é a mais importante, mas nem sempre temos como dosá-las, já que bons ensaios laboratoriais estão disponíveis. Para os hormônios tireoidianos, já tivemos grandes avanços na metodologia laboratorial, permitido que sejam amplamente solicitados quando há suspeita das disfunções da tireoide.
Os hormônios tireoidianos ligam-se dessa forma: aproximadamente 97,97% das moléculas de hormônio T4 (tetraiodotironina) estão ligadas às proteínas plasmáticas, enquanto 99,7% do T3 estão carreados. Isso significa que a fração livre dos dois tipos de hormônio é menor que um por cento.
Exemplos da importância das proteínas carreadoras na prática
Proteína carreadora do hormônio tireoidiano
A principal proteína ligadora dos hormônios tiroidianos é a TBG. Vou falar um pouco mais sobre essa proteína, pois pode haver uma “pegadinha” decorrente das variações da TBG na interpretação dos hormônios tireoidianos.
É bem comum que os pacientes sejam encaminhados com dosagens de hormônios tireoidianos totais altos, principalmente o T4 total, e se faça imediatamente a suspeita de hipertireoidismo. Em uma boa parcela dos casos, não é uma doença real, mas é um resultado laboratorial decorrente do aumento apenas da TBG e não da fração livre do hormônio tireoidiano. A dosagem de T4 total está alto e TSH normal sem que haja hipertiroidismo pode ocorrer na gravidez, no uso de pílulas contraceptivas, na terapia hormonal na menopausa com estrógeno, no uso de andrógenos, de outros hormônios anabolizantes e ainda no uso de altas doses de corticoides.
Para as pessoas que já tem hipotireoidismo e começam a usar hormônio feminino (estrógeno) via oral, a elevação da TBG pode fazer com que haja necessidade do aumento da dose de levotiroxina, pois mais desse hormônio se liga à proteína, diminuindo a fração livre. A redução da fração livre é refletida no aumento do TSH. Essa interação não acontece para os hormônios que são utilizados por outras vias, como adesivos e géis.
Há também situações que podem ser errôneamente diagnosticadas como hipotireoidismo por diminuição global dos níveis das proteínas carreadoras, como doenças do fígado e dos rins.
A TBG pode estar em excesso ou deficiente também por predisposição genética, além de outras doenças e condições clínicas que fogem ao objetivo desse texto.
Pelos motivos descritos acima, são consideradas a fração livre do T4 e não o T4 total. Em conjunto com TSH, o T4 livre permite diagnosticar a maior parte dos casos de disfunção da tireoide.
O T3 total sofre menos das variações da TBG, mas não é menos útil que o T4 para o diagnóstico das disfunções da tiroide.
Na prática clínica, a dosagem de TBG não é necessária na grande maioria dos casos onde há discrepância entre os níveis de T4 total e T4 livre, isso geralmente pode ser subentendido pela observação das causas comuns de aumento de TBG, como é no caso de uso de pílulas anticoncepcionais.
Outras proteínas carreadoras
Ainda falando da interferência da pílula anticoncepcional, pode haver aumento da dosagem de cortisol no sangue por conta do aumento nos níveis da globulina carreadora dos corticosteroides. Esse aumento não tem relevância clínica, isto é, não resulta e nem representa nenhuma doença.
Igualmente importantes são as variações da SHBG em diversas condições clínicas, como síndrome dos ovários policísticos e resistência à insulina, câncer. Para esses temas, há postagem separadas no blog. Vale a pena conferir!
Conclusões
Não se deve, portanto, chegar a conclusões precipitadas sobre alguma doença endocrinológica se baseando apenas nas dosagens isoladas de um ou outro hormônio e, sim, considerar as dosagens hormonais dentro de um todo, dentro de um contexto que inclui a interferência do uso de medicações, condições fisiológicas (exemplo – gravidez) e outras doenças crônicas que possam estar causando as variações na ligação dos hormônios às suas respectivas proteínas carreadoras.
Referências
Thyroxine-Binding Globulin (TBG). Site em inglês da Mayo Clinic sobre TBG
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