O que é perimenopausa?
A perimenopausa ou transição menopáusica é a fase que encontramos as mudanças da fase reprodutiva para a não-reprodutiva da mulher ou menopausa. Acontece com toda mulher que tenha vivido o suficiente para isso. Para umas, acontece mais cedo e para outras, mais tarde. Essa fase também é abrangida ao que chamamos no Brasil de climatério, embora esse termo esteja ficando em desuso. É um período variável antes e depois da última menstruação. É um período difícil para algumas mulheres, e para outras nem tanto.
Esse texto é baseado em um artigo de revisão do ano passado, publicado no jornal da Sociedade Americana de Endocrinologia, cuja referência está no final do post.
Didaticamente, a perimenopausa é dividida em duas fases, que inicialmente é relacionada apenas ao padrão do ciclo menstrual, mas parece ter correlações hormonais.
Nós, mulheres, nascemos com uma quantidade limitada de folículos ovarianos, e por isso, a menstruação finaliza em uma época da vida.
Os folículos são os primórdios dos óvulos que serão liberados em um período aproximado de um mês. Alguns folículos não se desenvolvem e atrofiam. O que se desenvolve a cada mês, produz hormônios e libera o óvulo a cada ciclo menstrual.
A menopausa é o estágio final da vida útil do ovário, quando há o esgotamento de toda reserva de folículos presentes ao nascimento.
Ciclo menstrual normal
Relembrando um pouco a fisiologia do ciclo menstrual, temos a fase folicular, em que alguns folículos primordiais são recrutados e um deles se torna dominante. O folículo dominante produz hormônios e libera o óvulo no período de ovulação. O período que se segue à ovulação é a fase lútea, caracterizada pela formação do corpo lúteo que produz progesterona para assegurar a gestação, se houver fecundação. Os detalhes dos hormônios da gestação está em outro post bem legal.


Fases da transição menopáusica
A fase de transição mais precoce é caracterizada por uma perturbação mínima no ciclo, com as mulheres tendo ao menos uma menstruação nos últimos 3 meses. Durante essa época, vários mecanismos compensatórios, como o aumento do hormônio hipofisário FSH (hormônio folículo-estimulante) em um esforço para recrutar os folículos ovarianos remanescentes. Podemos fazer uma análise dessa fase com o hipotireoidismo subclínico, em que há um aumento do TSH e manutenção dos níveis de hormônios tireoidianos normais.
Com o tempo, a mulher chega à fase tardia da perimenopausa, em que há deficiência de estrógeno e falência ovariana, a qual não pode mais ser mais compensada pelo aumento do FSH. Nessa segunda fase, os sintomas, que já poderiam estar presentes na fase precoce, se acentuam.
Antes da transição menopáusica, há a fase reprodutiva tardia e depois da transição, a fase de pós-menopausa precoce. Considerando o estágio zero quando os ciclos menstruais cessam, teríamos:
- -3 : fase reprodutiva tardia
- -2 : perimenopausa precoce
- -1 : perimenopausa tardia
- 0 : fim dos ciclos menstruais
- +1: pós-menopausa precoce (climatério)

Fase reprodutiva tardia
O declínio da reserva ovariana começa antes das mudanças no ciclo menstrual. O hormônio antimulleriano (HAM) produzido pelas células da granulosa dos folículos menores, antes de um deles se tornar dominante, reduzem nesse estágio comparado com o pico da fase reprodutiva. O hormônio antimulleriano atinge seu pico aos 25 anos e vai reduzindo progressivamente durante a vida reprodutiva. Esse marcador é muito utilizado na medicina reprodutiva para avaliar a reserva ovariana, juntamente com a inibina B e a contagem de folículos ao ultrassom.
O FSH pode ser normal ou elevado de forma intermitente nessa fase. Os ciclos podem ser de normais a levemente irregulares. Outro hormônio chamado inibina B, produzido pelos folículos maiores e responsável pela inibição do FSH, também está reduzido.
Perimenopausa precoce
A mulher entra nessa fase quando há uma diferença maior ou igual a 7 dias na duração de um ciclo menstrual para outro. Nela, a depleção dos folículos continua e o declínio do HAM reduz a inibição da ativação de outros folículos. Dessa forma, a ativação e o crescimento dos folículos remanescentes mantido à despeito da quantidade diminuída de seu número. A maioria dos ciclos são ovulatórios ainda.
A inibina B é um hormônio cada vez mais reduzido e a sua diminuição alivia o feedback negativo do FSH, ou seja, libera o FSH para que seja secretado pela hipófise de forma mais intensa e precoce. Há uma redução da fase folicular.
Apesar de haver uma redução na fase folicular, a enzima aromatase está mais ativa e consegue manter a produção do estrógeno semelhante às fases mais precoces da vida reprodutiva.

Após a ovulação, observa-se uma produção reduzida de progesterona e inibina A pelo corpo lúteo comparada com meados da fase reprodutiva. A redução da fase lútea associada ao recrutamento precoce de folículos leva à redução da duração do ciclo subsequente, com ciclos curtos sendo mais comuns nessa fase.
Perimenopausa tardia
Quando a mulher passa 60 dias ou mais sem menstruar, ela entrou na fase nessa fase, na qual os mecanismos compensatórios falham. O FSH está aumentado de forma consistente, os níveis de estrógeno variam um pouco, mas estando menores na maior parte do tempo e os ciclos são anovulatórios com mais frequência. Nessa fase, ainda existe o risco/possibilidade de gravidez.
Pós-menopausa precoce
São os 12 meses subsequentes à última menstruação. Nessa fase, a reserva ovariana é indetectável, o FSH continua a subir e o estrógeno continua a descer e se estabilizar após dois anos da fase final dos ciclos menstruais.
Sinais e sintomas da perimenopausa
A duração média da transição menopáusica é de aproximadamente 4 anos. Os sintomas da menopausa tipicamente começam leves e vão se intensificando no final quando a amenorreia (ausência de menstruação) prolongada e os níveis de estrógeno mais baixos. Padrões de sangramento irregulares, com mudanças na duração do ciclo e tempo de sangramento são os sinais mais precoces da perimenopausa.
Os sintomas são mais frequentes e graves nos primeiros anos ou nos primeiro dois anos depois da última menstruação, mas algumas mulheres podem ter sintomas por até por uma década.
Sintomas vasomotores e sistema cardiovascular
Ondas de calor, os fogachos, são os sintomas vasomotores que afetam a maioria das mulheres que estão na perimenopausa e pioram a qualidade de vida. As ondas de calor duram vários minutos, começando com sensação de calor e vermelhidão na metade superior do corpo. Esse sintoma é produzido pela falta de estrógeno no centro no hipotálamo que regula a temperatura. A terapia hormonal é o tratamento mais efetivo para controle desse sintoma.
Em média, esse sintoma persiste por 4 a 5 anos, mas cerca de 25% das mulheres podem tê-lo até 10 anos. A terapia hormonal é o tratamento mais efetivo para dos fogachos.
O sintoma vasomotor é aparentemente um sintoma benigno. Muito embora, sintomas vasomotores intensos e prolongados são associados com aumento do risco cardiovascular. Não se sabe se o tratamento de fogachos graves ou tardios melhoram atenua o risco cardiovascular. Vamos ver mais adiante, que a terapia hormonal não é indicada para prevenção ou tratamento de doenças cardiovasculares, como outrora foi.
Geniturinário
As mudanças são decorrentes da falta do estrógeno e incluem atrofia da vulva e vagina, ressecamento vaginal, estreitamento e encurtamento da vagina, prolapso uterino e incontinência urinária. Essas mudanças podem causar dor no ato sexual, irritação local e aumento do risco de infecções urinárias. O tratamento com estrógeno alivia a maioria dos sintomas, exceto a incontinência urinária.
Humor
As variações de humor são principalmente aumento de depressão e ansiedade. Fatores de risco para depressão incluem história de depressão previamente, mas há também casos de um primeiro episódio depressivo, provavelmente devido ao aumento dos sintomas da perimenopausa.
Cognição
Durante a transição da menopausa, há um declínio da parte cognitiva, mas que parece retornar ao que era antes no fim do período da perimenopausa. A perda cognitiva aparentemente está mais associada à idade cronológica que a menopausa.
Sono
O envelhecimento está associado a uma piora no padrão de sono, entretanto, a maioria dos estudiosos sugerem que a perimenopausa piora a deterioração do sono. Essa piora não é totalmente explicada pelo aumento dos sintomas vasomotores à noite. As mulheres que relatam uma piora do padrão de sono têm fatores associados, como depressão, ansiedade, tabagismo, apneia obstrutiva do sono e baixa atividade física.
Libido
A diminuição do desejo sexual é prevalente nessa fase e pode atingir cerca de 10% das mulheres. Pensa-se que o baixo estrógeno e a redução da testosterona associadas ao envelhecimento podem ter efeitos sinérgicos para a redução do desejo sexual feminino.
Entretanto, a reposição de testosterona na mulher que tenha ou não os ovários funcionando mostrou pouco benefício no desejo sexual e na satisfação durante o ato sexual. O desejo sexual hipoativo nas mulheres é um diagnóstico clínico (não carece de exames laboratoriais), que é caracterizado por redução significativa do interesse ou da excitação sexual. Para esse problema, há duas medicações aprovadas nos EUA, mas elas não têm nada a ver com a testosterona. São medicações relacionadas com receptores para melanocortina e outra com os receptores de serotonina.
Ossos
A menopausa é um período em que há aumento da reabsorção óssea. O estrógeno é um agente antirreabsortivo potente, pois estimula os osteoblastos (células que formam osso) e aumentam a absorção de cálcio no intestino. O pico de massa óssea é atingido por volta dos 30 anos e a densidade óssea cai aproximadamente 0,7% ao ano.
A perda óssea fica acelerada um ano antes do fim dos ciclos menstruais e persiste até 3 anos após, com uma porcentagem queda da densidade mineral óssea que pode chegar a 5% ao ano. Depois essa velocidade de perda diminui, chegando aos níveis pré-menopausa.
Tratamento dos sintomas da perimenopausa
As opções de tratamento para os sintomas da menopausa incluem a terapia hormonal, medicações não hormonais e tratamento não medicamentoso.
Terapia hormonal
O tratamento com hormônios é considerado efetivo e seguro em pacientes com baixo risco cardiovascular, sem doença coronariana ou história de câncer de mama, <60 anos e com menos de 10 anos do início da menopausa.
A terapia hormonal NÃO deve ser usada como prevenção primária ou secundária para doença cardiovascular, embora tenha sido prescrita para essa finalidade no passado.
O risco de câncer de mama também deve ser seriamente considerado antes do início de uma terapia hormonal. Pacientes que já tenham tido câncer de mama ou que apresentem alto risco para tal, devem ser aconselhadas a iniciar uma alternativa de tratamento não hormonal.
Devido ao risco de câncer de mama com a terapia combinada de estrógeno mais progestágeno ser progressivo, mas de pequena ordem. As diretrizes dizem que até 5 anos de tratamento hormonal conferem risco baixo para essa complicação. Nas mulheres sem útero, que não precisam usar progestágeno, apenas estrógenos, parece haver uma redução do risco de câncer de mama.
Os esquemas de tratamento com hormônios são diversos, desde orais, transdérmicos e vaginais.
Eu não vou detalhar muito essa parte, pois não há receita de bolo. O que parece ser consenso é na reposição hormonal é o uso de progestágeno em mulheres que tenham útero para evitar proliferação ou câncer de endométrio. O sistema intrauterino com levonorgestrel, mais conhecido como DIU hormonal, também cumpre bem esse papel.
A terapia hormonal oral ou transdérmica é aconselha para o tratamento dos fogachos, enquanto as preparações vaginais são preferidas se as queixas são principalmente geniturinárias. O tratamento via vaginal não precisa associar progestágeno.
Terapia medicamentosa não hormonal
Indicada nas mulheres que têm receio ou contraindicação à terapia hormonal. Aqui entram os inibidores de recaptura da serotonina. O único aprovado nos Estados Unidos para o tratamento dos fogachos é a paroxetina. A gente não gosta muito desse antidepressivo pelo ganho de peso que ele pode provocar. O escitalopran é mais moderno e pode ser considerado em pacientes que tenham transtornos do humor ou do sono.
A clonidina trata hipertensão, mas pode mostrou ser útil no tratamento dos fogachos. A última medicação das que estão no mercado é a gabapentina, uma velha conhecida também. Mas vem coisa nova por ai…
Terapia não medicamentosa
São tratamentos menos estudados e por isso, há menos evidência científica para eles. Estratégias como terapia cognitivo-comportamental são úteis para insônia. Uma boa higiene do sono é fundamental. Yoga também se mostrou válida para insônia.
Exercício físico aeróbico melhora a insônia, mas não os fogachos.
O que não se mostrou útil nos estudos para insônia e humor: suplementos de ômega-3,
Conselhos úteis: reduzir o estresse quando possível, fazer algo divertido antes de dormir, vestir-se em camadas (como uma cebola), consumir bebidas geladas e evitar alimentos potencialmente ruins para o sono como cafeína, alimentos picantes e álcool.
Lubrificantes vaginais podem ser usados antes da relação sexual e não precisam de prescrição médica. Podem ser aplicados várias vezes ao dia e aliviam a dor durante o sexo.
Em resumo
Paciente com menos de 60 anos de idade, que estejam não mais que 10 anos do início da menopausa, a terapia hormonal é um tratamento seguro para os sintomas da menopausa. Tem que aproveitar a “janela de oportunidade”.
As pacientes devem fazer uma avaliação do seu risco cardiovascular e de câncer de mama antes de começar o tratamento hormonal.
Os pacientes sintomáticos podem necessitar de um desmame dos esquemas de terapia hormonal enquanto adicionam esquemas não-hormonais para alívio dos sintomas.
Considerações finais
A transição menopáusica é um processo “irregularmente irregular”, que começa na terceira década de vida e pode durar mais de um a década.
A maioria das mulheres vão se relatar aos seus médicos sobre as mudanças da perimenopausa. Nesse momento, mesmo que o médico não prescreva terapia hormonal, pode ajudar em tratamentos não hormonais ou indicando terapias e estratégias não medicamentosas. Por exemplo, é importante perder peso para reduzir as perturbações dos fogachos.
Independente da estratégia que você optar junto com o seu médico para atravessar a perimenopausa, lembre-se que é só uma fase. A menopausa não é uma doença, é uma fase de transição de uma etapa a outra da vida, que tem seus desafios próprios.
Aqui vou deixar um último parágrafo para falar sobre a minha prática em relação ao tema: eu prescrevo hormônios para os sintomas da menopausa, mas em acompanhamento conjunto com o ginecologista, que está mais habituado a avaliar as alterações em mama e investigar sangramento genital caso ocorra. Importante é você ter profissionais parceiros e competentse para atravessar essa fase da vida.
Referências
Nanette Santoro, Cassandra Roeca, Brandilyn A Peters, Genevieve Neal-Perry, The Menopause Transition: Signs, Symptoms, and Management Options, The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism, Volume 106, Issue 1, January 2021, Pages 1–15, https://doi.org/10.1210/clinem/dgaa764
Departamento de Endocrinologia Feminina e Andrologia da SBEM – https://www.endocrino.org.br/endocrinologia-feminina-e-andrologia/
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